Jornal Correio Braziliense

Brasil

Moradores da Zona Norte do Rio vivem sob o medo do confronto armado chegar

Nas áreas mais ricas da cidade, a rotina, durante o dia, mudou pouco

Rio de Janeiro ; Dividido, o Rio vive realidades diferentes nesta semana. Viviane de Andrade, moradora de Botafogo, na Zona Sul carioca, acordou ontem no mesmo horário de sempre para trabalhar e foi ao Shopping Leblon no fim da tarde. ;Um dia como outro qualquer. A diferença é que tem mais policiais nas ruas e algumas pessoas foram liberadas do trabalho mais cedo. A preocupação é só à noite. Pelo menos por aqui;, disse. Já Simone, que preferiu não divulgar o sobrenome, mora perto da entrada da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão, favelas da Zona Norte. ;Estou apavorada;, bradou.

;As crianças estão assustadas. Não dá para continuar assim. Ontem (quinta-feira), ouvimos muitos tiros. As pessoas corriam pelas ruas desesperadas. Está horrível essa violência. Se continuar assim, não poderemos mais sair de casa;, emendou, referindo-se ao confronto entre policiais e traficantes na Vila Cruzeiro. Os moradores da Penha e dos bairros vizinhos são unânimes em afirmar que se sentem presos e com medo de andar nas ruas por conta das balas perdidas.

Desde que começou o confronto na região, as crianças não têm aulas. O comércio na Penha, bairro que abriga o maior reduto do tráfico de drogas atualmente, voltou a abrir ontem. A maioria, porém, fechou as portas antes das 14h. ;Não tem jeito de manter aberto. Não tem cliente;, lamentou Rodrigo Santos, que costuma fechar a papelaria às 19h.

Para a maioria da população da área, a ação do governo estadual é um mal necessário. Há, por outro lado, quem questione o destino do bairro quando a polícia for embora. ;O problema é a polícia fazer isso e depois sair. Eles saem e a gente fica. Como nós ficamos depois? Está ruim em todas as partes. Mas na Zona Sul tem mais polícia e ela fica lá depois. Lá moram os donos, os governantes;, assegurou um morador da Zona Norte que se identificou como Pereira.

Enquanto isso, os cariocas da Zona Sul acompanharam o caos da Penha e de outros bairros da Zona Norte pela televisão. O choque foi geral, mas a região manteve sua rotina ; pelo menos durante o dia. A mudança mais sentida foi o aumento de policiais e as ruas vazias à noite. ;Circulei sem problemas pela Zona Sul e pela Barra da Tijuca (Zona Oeste). Vejo que as pessoas estão assustadas, só que essa realidade cruel não está tão próxima assim. Parece que estamos vendo um filme. Temo mais pelos que moram na Zona Norte e na Baixada Fluminense, principalmente perto dos morros que ainda não têm UPP;, disse Daniel Garcia.

Nos cinco primeiros dias de ataque, cerca de 5% dos atentados ocorreram na Zona Sul, parte mais rica da cidade. A geografia é bem diferente do que aconteceu em ondas de violência no passado. Isso pode ser explicado pelo fato de a região concentrar os projetos de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), o que provocou a fuga dos traficantes da área para favelas da Zona Norte, como a Vila Cruzeiro, dominada na quinta-feira pela polícia. A Rocinha, em São Conrado, na Zona Sul, é a exceção e continua comandada por traficantes. A Zona Norte foi atingida em 40% dos ataques de domingo a quinta-feira.