Quando mais precisou da rede pública de saúde, o encarregado de condomínio Ezequiel Amado, 36 anos, se viu obrigado a procurar um hospital particular. Depois de ferir a perna num acidente, ele foi parar na rede pública. Sem médico e sem atendimento, desembolsou R$ 3,8 mil pela cirurgia que decidiu fazer numa unidade privada. ;O atendimento em saúde precisa ser muito mais rápido.;
Se Ezequiel tivesse sido entrevistado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), para o cálculo do Índice de Valores Humanos (IVH), suas respostas coincidiriam com a manifestação da maioria das 2.002 pessoas abordadas, em 24 unidades da Federação. Os brasileiros consideram a saúde o pior serviço prestado no país, se comparado com educação e oferta e condições de trabalho. O IVH varia de 0 a 1 e, no caso específico do IVH para saúde, o índice ficou em 0,449. O IVH em educação é de 0,54. O maior deles é o IVH de trabalho: 0,79.
A média desses três subíndices corresponde ao IVH no Brasil: 0,594. ;Não ter chegado a 0,6 significa que ainda há muita coisa para se fazer;, ressalta o economista do Pnud responsável pelo levantamento, Flávio Comim, que divulgou os dados ontem. O IVH faz uma relação entre os valores dos brasileiros e o desenvolvimento humano no país. É uma forma de percepção sobre o desenvolvimento a partir de fatores qualitativos, e não somente quantitativos, como a renda per capita do trabalhador e os índices de escolaridade. As experiências vividas pelos brasileiros são decisivas na análise do Pnud.
Para calcular o IVH de saúde, o Pnud analisou o tempo de espera por atendimento médico, a linguagem utilizada pelos profissionais de saúde e o interesse demonstrado por esses profissionais no atendimento prestado. Os maiores índices foram apurados nas regiões Sul e Sudeste. Os piores, no Norte e no Nordeste. Na região Norte, por exemplo, 67% dos entrevistados consideram que o último atendimento em alguma unidade de saúde demorou demais.
As regiões Sul e Sudeste também têm os melhores IVHs para trabalho e educação. No geral, o IVH em cada região é de 0,62, quase 5% maior do que a média nacional. Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Ceará, São Paulo e Rio de Janeiro ; nesta ordem ; são os estados com os melhores IVHs do país. O Distrito Federal não aparece entre os nove melhores índices.
O que contou para avaliar a percepção sobre educação foram os valores de famílias, alunos e professores em relação à escola. No caso do trabalho, a pesquisa buscou identificar as vivências de prazer, como realização profissional, e sofrimento ; a falta de reconhecimento é um exemplo ; dos brasileiros no ambiente de trabalho. O índice mais baixo, 0,68, foi registrado no Centro-Oeste.
A agente de vigilância de saúde Mirian de Souza Nobre, 30, diz estar satisfeita com o trabalho, mas decidiu cursar psicologia e fazer um cursinho para concursos para melhorar o salário de R$ 1,8 mil. ;O custo de vida aumenta e, apesar de a renda em Brasília ser alta, quero passar em outro concurso.; O maior IVH geral, de 0,71, foi apurado em brasileiros com salários entre 10 e 20 salários mínimos e com pós-graduação. O índice para educação é o mesmo para quem tem essa renda e para quem ganha um salário mínimo.
A elaboração do IVH faz parte do terceiro capítulo do Relatório de Desenvolvimento Humano Brasileiro 2009/2010, elaborado pelo Pnud. O segundo capítulo mapeou o Perfil dos Valores dos Brasileiros (PVB). O relatório será finalizado com a conclusão dos Índices de Desenvolvimento Humano dos Municípios (IDH-M), que serão divulgados em novembro.