Primeiro, ela não teve incentivo. Depois, vieram os filhos e a falta de tempo. Agora, aos 46 anos, a professora Carla Maria Madureira sonha com o ingresso na faculdade. ;O professor não deixa de ser digno sem um curso superior. Mas agora é uma questão de honra, e de vontade de aprender;, afirma. Carla ensina para os alunos da 4; série da Escola Classe II do Guará, e integra o percentual de 3,14% de profissionais sem graduação da Secretaria de Educação do Distrito Federal, que conta com 29.116 professores ativos na rede pública.
A docente pretende ingressar no curso superior no início do ano que vem, incentivada por aprovação ocorrida este mês no Senado Federal: a exigência de curso superior para professores da educação básica. Com a proposta, os docentes dos cinco anos iniciais do ensino fundamental (1; ao 5; ano, ou Jardim III à 4; série) que ingressarem na carreira terão um prazo de até seis anos para concluírem o curso de graduação. Caso não consiga se formar, o professor deverá lecionar apenas para alunos do ensino infantil. Ao saber da aprovação, Carla confessa que ficou receosa em perder o direito ao cargo. No entanto, quem já integrava o quadro da educação básica antes da proposta conta com direito adquirido e, portanto, terá o incentivo à formação, mas não será obrigado a concluir uma graduação.
A proposta, aprovada no início de julho por meio do substitutivo ao Projeto de Lei da Câmara (PLC) 280/09, ainda deve ser aprovada pela Câmara dos Deputados. Se dependesse da diretora da Escola Classe II do Guará, Eliana Alves de Souza, a medida teria encaminhamento urgente. ;Muitos professores ficam acomodados e cansados. Mas eles são espelho para o aluno. É importante ter ensino superior, até para servir de exemplo. Por outro lado, a faculdade abre horizontes. Se o professor não se recicla, não estuda.;
Sem universidade
O secretário-geral da Conferedação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Denílson Costa, enxerga a norma como positiva, devido ao incentivo à qualificação. No entanto, ainda aguarda respostas em relação à efetividade da exigência. ;É extremamente importante que os educadores se qualifiquem. Mas o Brasil é um país extenso, com diferentes realidades. Existem lugares onde não há universidades, faculdades, cursos de extensão. Como o Estado vai resolver isso?;, questiona. Para o secretário, é necessária uma política pública específica para atender locais ermos. Ele defende ainda que o governo deveria aproveitar a oportunidade da proposta para revisar a matriz curricular dos cursos de pedagogia. ;A educação deve se adequar às novas realidades, e o fato é que as grades curriculares estão defasadas;, defende.
A secretária de Educação Básica do MEC, Maria Pilar, enfatiza que o governo federal oferece o Plano Nacional de Formação de Professores, como apoio à graduação dos profissionais da educação básica que ainda não têm formação superior. ;O MEC não precisará criar um novo suporte de apoio aos profissionais em função da existência do Plano de Formação, a principal política nesse sentido. O que precisa aumentar é o apoio das secretarias estaduais e municipais. Eles precisam dar condições para que os profissionais frequentem os cursos. Na Bahia, por exemplo, professores recebem uma bolsa que custeia o transporte usado para a realização do curso;, afirma. O plano foi criado em 2009 com o objetivo de formar, em cinco anos, 330 mil professores que atuam na educação básica sem graduação.
No Distrito Federal, a maioria dos 916 professores sem graduação atuam na educação infantil. De acordo com a secretaria, o percentual é pequeno devido à exigência da graduação nos concursos ; desde 2000 ; e a convênios feitos entre a secretaria e instituições de ensino superior. Em 21 de junho de 2010, o governo do DF publicou o Decreto n; 31.821, que criou um grupo de trabalho para estudar e propor a criação da Instituição de Nível Superior de Educação do Distrito Federal.
Segundo o secretário de Educação, Marcelo Aguiar, a maior parte das vagas do novo instituto deverão ser ocupadas por professores da rede pública do DF. ;Queremos oferecer cursos de pedagogia e outras licenciaturas onde existe mais carência de professores. Porque, na rede, alguns professores ainda atuam em área diferente da sua formação;, conta.