Sete pequisas realizadas pelo Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Criança e o Adolescente, em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e a Comissão Interestadual de Combate à Exploração e Abuso Sexual de Crianças e Adolescentes da Região Centro-Oeste (Circo), mostram as primeiras impressões sobre o mercado sexual no Brasil.
O objetivo das pesquisas é fazer um diagnóstico qualitativo para municiar as entidades e órgãos governamentais que atuam no enfrentamento à exploração sexual. ;Compreendendo como a exploração sexual ocorre, teremos melhores condições para enfrentá-la;, afirma a pesquisadora Estela Scandola, representante do Comitê Nacional em Mato Grosso do Sul.
O conjunto de estudos está sendo feito em áreas de fronteira, em garimpos, na BR-163, em comunidades indígenas, em áreas de transporte fluvial, no setor sucroalcooleiro (locais de plantação de cana-de-açúcar e destilarias de álcool) e em locais de atendimento às vítimas de violência sexual.
O estudo mostra que a exploração sexual está inserida nas relações de trabalho e, como nas demais cadeias produtivas, aparece em três vértices: a demanda, a oferta e o mercado. Mulheres, crianças e adolescentes produzem mercadoria e por vezes são mercadorias que produzem mercadorias.
A pesquisa do setor sucroalcooleiro já está em fase de conclusão, mas ainda não tem data para ser lançada. O trabalho foi realizado em cidades onde toda a economia e a vida social e cultural giram em torno de duas ou três megadestilarias de álcool. O estudo mostra que a presença deste setor impacta decisivamente na organização da cidade e na construção de um único modelo de desenvolvimento.
Segunda Estela, observou-se na pesquisa que antes da instalação de um empreendimento desse porte ocorre toda uma preparação anterior do local, a viabilização de moradias, de pontos para alimentação e também do comércio sexual que vai atuar na localidade.
;Temos percebido que o comércio sexual sempre chega antes e depois vai se reabastecendo para manter os trabalhadores e aplainar a saudade das famílias. Dos empregados menos remunerados ao mais alto escalão da indústria, todos se servem do comércio sexual local;, destaca Estela.
De acordo com a pesquisaora, os preconceitos e as discriminações presentes em toda a sociedade são sedimentados no mercado sexual. ;Na plantação de cana, se a menina tiver um caso com o cortador de cana, é exploração sexual, mas, se ela estiver com um funcionário bem remunerado da empresa, está namorando.;
As demais pesquisas ainda estão em fase de coleta de dados. No caso do garimpo, a pesquisa foi feita em cidades remanescentes de mineração. Segundo Estela, essas cidades têm o estigma do garimpo e não conseguem sair do novo patamar cultural de local de exploração sexual. ;A pesquisa aponta que, embora naquela cidade não exista mais garimpo, a cultura da exploração sexual permanece. Deixa tatuagens culturais.;
A pesquisadora destaca também informações sobre o estudo realizado na BR-163 em sete municípios de Mato Grosso do Sul. A rodovia federal liga o país do Rio Grande do Sul ao Pará. Em todos os municípios estudados, os resultados foram semelhantes.
;Continuamos trabalhando com a ideia de uma sexualidade masculina incontrolável. As meninas são oferecidas, vão convencer os homens para a atividade sexual, e as mães são as responsáveis por não conseguirem manter as filhas em casa. Isso evidencia uma sociedade bastante conservadora;, salienta.
Para o enfrentamento à exploração sexual, Estela sugere que os organismos oficiais de financiamento imponham condicionalidades às empresas antes da aprovação do crédito.
;Os financiamentos oficiais deveriam exigir condições para não impactar, de forma tão desastrosa, os municípios. É preciso negociar a implantação do empreendimento, deixando claro os problemas que serão vividos pela comunidade ;, conclui
Estela Scandola participou, nesta semana, em Brasília, do seminário Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes: Novas Estratégias de Enfrentamento, organizado pelo Conselho Nacional do Serviço Social da Indústria (Sesi) e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.