Jornal Correio Braziliense

Brasil

Criminosos mais perigosos do país ocupam presídios de segurança máxima por tempo demais

Embora idealizadas para receber presos de altíssima periculosidade por até um ano, as quatro penitenciárias federais de segurança máxima do Brasil têm hoje, em mãos, detentos que, de tão ameaçadores, dificilmente retornarão aos estabelecimentos estaduais. O primeiro ;hóspede; do sistema é um caso clássico. Luiz Fernando da Costa, traficante mais conhecido como Beira-Mar, estreou a unidade de Catanduvas (PR) em 2006 e depois foi removido para o presídio de Campo Grande (MS), onde permanece até hoje. A antiguidade, porém, não é exclusividade de Beira-Mar. Dez abrigados atualmente nas penitenciárias especiais ; alguns por tempo superior a três anos ; estão entre os presos mais perigosos do país. Na ficha desses possíveis veteranos no sistema administrado pela União, tráfico de armas, de drogas, homicídios e comportamento sanguinário são itens quase sempre presentes.

No entanto, o que mais preocupa Wilson Salles Damázio, diretor do Sistema Penitenciário Federal, é o poder econômico de tais presos. ;O cara que atua como líder do tráfico de drogas ou de armas tem muito dinheiro, obviamente. Mas há também os que matam pelo simples prazer de matar, os serial killers;, explica Damázio. Anônimo para os holofotes da mídia, porém não menos perigoso, Nego Jaime ordenava, de dentro do presídio em Charqueadas (RS), execuções sumárias. Pedia aos seus ;funcionários; que ligassem para o celular dele no momento do assassinato, para ouvir a vítima agonizando. Condenado a 45 anos, está na penitenciária de Campo Grande desde outubro de 2009. O DF também ;exporta; para o sistema federal presos de máxima periculosidade. No mês passado, João Maria de Araújo, na Papuda por roubo a bancos, foi enviado à unidade de segurança máxima mais recente, em Mossoró (RN).

O movimento nas penitenciárias federais é constante. Semanalmente, há lideranças de facções criminosas chegando às unidades. O tempo médio de permanência é de um ano. Mas, dependendo do caso, vão ficando. ;Nós temos aceitado os pedidos de prorrogação porque entendemos os motivos alegados;, destaca Damázio. A ida e vinda de um mesmo detento, segundo ele, não é corriqueira. ;Ocorreu de o preso ingressar no sistema no máximo duas vezes. Beira-Mar foi assim, quando voltou para o Complexo de Gericinó, no Rio de Janeiro. Só que ocorreu tanta morte influenciada por ele lá, que acharam por bem mandá-lo de volta;, explica o diretor do Sistema Penitenciário Federal. Uma minoria está nas unidades federais em benefício próprio, por conta de risco de morte.

Visita íntima

Para o especialista em criminalidade, Walter Maierovitch, é preciso traçar metas e atingi-las para não ;avacalharem um sistema que dá certo em outros países;. ;Na Itália, a instituição do chamado cárcere duro, que eram penitenciárias afastadas do Sul do país, onde estava a máfia, foi um sucesso absoluto. Mas lá havia rigor;, alerta o ex-secretário nacional antidrogas. ;As visitas eram com microfone e com filmagem para o preso não passar mensagens por gestos, restringiam os colóquios com familiares. Aqui já houve até suspeitas de presos com celular, já encontraram cocaína em um estabelecimento.; Na avaliação de Damázio, porém, duas ocorrências de drogas em pequenas porções nos quatro anos de existência do sistema federal não significam falhas graves. ;A visita íntima, hoje, é a principal vulnerabilidade. Mas estamos sempre nos aperfeiçoando. A conduta dos advogados é outro foco de atenção;, diz.

O desafio de isolar, de fato, os líderes criminosos detidos, para que não comandem suas facções de dentro dos presídios, está na precariedade dos sistemas estaduais, segundo o ex-diretor do Departamento Penitenciário Federal, Maurício Kuehne. ;Um a dois anos deveria ser o tempo mais que suficiente para o estado se organizar e receber de volta o detento que ficou na unidade federal. Acontece que, no Brasil, as penitenciárias carecem de um tripé básico, que é estrutura física adequada, tecnologia e recursos humanos. O trabalho na área prisional, infelizmente, é feito na base do amadorismo. Falta um pouco de dinheiro, mas também vontade política entre os gestores estaduais;, critica. Entre os 454 presos atualmente nos quatro presídios federais, a maioria vem de Rondônia (73), Rio de Janeiro (53) e Paraná (52). Do DF, há dois. Mulheres não são detidas nesses locais.


DENÚNCIA INTERNACIONAL
Oito fotografias assustarão os integrantes do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, amanhã. Serão exibidas, para denunciar as condições das penitenciárias do Espírito Santo, imagens de corpos esquartejados de três presos: um numa lata, outro em caixas e uma cabeça dentro de um saco plástico. Batizado de masmorras capixabas, o caso será apresentado por movimentos sociais brasileiros, que apontam o governador Paulo Hartung como responsável direto pelo problema.