Os dois policiais acusados de sequestrar, roubar e molestar uma vendedora no Rio de Janeiro tiveram a prisão temporária de 10 dias decretada ontem. Rodrigo Nogueira Batista, 30 anos, e o cabo Marcelo Machado Carneiro, 40, passaram por exames no Instituto Médico Legal (IML) antes de seguirem para o Batalhão Especial Prisional, onde aguardarão a conclusão do Inquérito Policial Militar. Em menos de dois meses, esse é o terceiro caso de PMs cariocas envolvidos em crimes graves. O episódio mancha a imagem já desgastada da corporação, ao mesmo tempo em que divide a opinião de especialistas sobre o que deve ser feito para coibir a inversão de papéis entre polícia e bandido.
Vera Malaguti, secretária-geral do Instituto Carioca de Criminologia (ICC), aponta o comportamento criminoso como consequência do próprio cotidiano do policial. ;Existe uma comunicação entre esses atos bárbaros e a formação do agente, o que a sociedade cobra dele e o seu dia a dia. O que esperar do policial que tem como rotina entrar na favela, matar, arrastar corpos?;, questiona a especialista. Para Vera, é preciso que a polícia carioca abandone a filosofia de guerra. ;É uma forma de trabalho que transforma os policiais em bichos soltos, como os combatentes dos Estados Unidos que saem da guerra como psicopatas;, diz.
Professor do Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Ignácio Cano discorda da ideia. ;Não se trata de um crime de desequilíbrio, em que o policial atira sem motivo e mata dez pessoas. Estamos falando de desvios pontuais, com motivações bem definidas;, afirma o sociólogo. Na avaliação dele, uma primeira medida para evitar os crimes entre policiais seria fortalecer as corregedorias e ouvidorias. ;São estruturas muito pequenas para o tamanho do problema que precisam enfrentar. Não há gratificação, formação ou plano de carreira para quem trabalha nesses órgãos;, diz Cano. Outra providência, segundo ele, seria melhorar o treinamento, a remuneração e aumentar os requisitos para ingresso na carreira ; que hoje é o ensino médio em praticamente todos os estados.
Na noite de sexta-feira, uma vendedora de 21 anos diz ter sido abordada no centro do Rio por dois policiais militares e obrigada a entrar no carro. Eles exigiram dinheiro para soltá-la. Ela conta que entregou os R$ 1,7 mil que tinha na bolsa. Em uma estrada afastada, no Parque Nacional da Tijuca, ela teria sido molestada sexualmente e baleada no rosto. A jovem ainda teria caído de uma ribanceira de nove metros. A vendedora foi encontrada por um ciclista e levada a um hospital. Na delegacia, reconheceu os PMs.
Em outubro, o soldado Diego Luis Carvalho Varanda, 23 anos, foi preso após roubar pedestres e trocar tiros com colegas de farda em um carro roubado. Um caso recente mais notório, também em outubro, foi o de dois policiais que pegaram os pertences do coordenador do AfroReggae, Evandro João da Silva, baleado momentos antes por dois assaltantes no Rio. A vítima agonizou e morreu no local, sem receber ajuda dos agentes. Acusados de prevaricação e furto qualificado, Dennys Leonard Nogueira Bizarro e Marcos de Oliveira Sales estão presos.