Maior acidente radioativo do mundo ocorrido fora das usinas nucleares, o vazamento de césio 137 em 13 de setembro de 1987, em Goiânia (GO), ganhará, 23 anos depois, um memorial, que reunirá um museu e uma praça nos mesmos locais onde ocorreu a tragédia. Na Rua 57 do Setor Aeroporto, centro da capital goiana ; endereço onde foi aberta a cápsula com o elemento químico ;, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) e o governo estadual construirão um corredor de luzes naturais que simula uma caixa de 3m de largura e 42m de comprimento. Já na Rua 26-A, localizada no mesmo bairro, outra área com vazão do metal, será erguido um largo para eventos culturais. O objetivo é não deixar a tragédia cair em esquecimento e acabar com o estigma em torno das pessoas que manusearam o material radioativo.
Com orçamento de R$ 1 milhão, a construção do museu vai ser compartilhada entre o governo de Goiás, com a contrapartida de R$ 500 mil, e a Cnem, encarregada de repassar os outros R$ 500 mil. ;As obras devem ficar prontas em junho de 2010, e nosso objetivo é deixar o visitante com uma ampla visão do que aconteceu e todas as providências adotadas para evitar a contaminação de mais pessoas;, explica o coordenador do Centro Regional de Ciências Nucleares do Centro-Oeste (CRCN-CO), Leonardo Lage. Já a praça, com custo estimado entre R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões, será erguida com recursos da Prefeitura de Goiânia e da Cnem. A intenção é inaugurar as duas obras na mesma data. Os idealizadores do projeto buscarão também apoio de grandes empresas, como a Petrobras.
O artista plástico goiano Siron Franco será o responsável pelo desenvolvimento do projeto do museu. Com 35 blocos de resina, Siron retratará a cronologia dos fatos. ;Vamos fornecer todas as informações necessárias para que Franco mostre, com detalhes, como tudo aconteceu;, diz Lage. Para Franco, que acompanhou de perto a história da tragédia e criou pinturas mostrando que o vazamento ocorreu em áreas isoladas de Goiânia, o convite põe em prática um grande desejo. ;Sempre tive vontade de criar algo para desmistificar o vazamento do césio. As pessoas ainda têm muito preconceito;, observa o artista plástico. Segundo ele, o espaço vai ter caráter dramático, porém, com informações científicas: o que é radiação, contaminação, rocha de urânio em estado natural. ;Vai ser visualmente muito rico. Sempre pensei que aquilo pudesse ser um centro, com documentação, inclusive, para tirar o estigma. Muita gente acha que está tudo contaminado naquela área, e não está;, explica o artista.
O número
Orçamento - Estima-se que sejam gastos ao menos R$2,5 milhões nas obras do museu e da praça em Goiânia
História em blocos
Os 35 blocos de resina transparente, que darão uma ideia de fatos congelados no tempo, vão mostrar passo a passo tudo o que ocorreu em Goiânia desde setembro de 1987. Dentro das peças cristalinas deverão ser instaladas máscaras, bonecas, fotografias de vítimas em tamanho natural e recortes de jornais da época sobre o vazamento do césio 137.
A criação de um museu para lembrar as vítimas do vazamento do césio é um sonho antigo do presidente da Associação das Vítimas do Césio 137, Odesson Ferreira. ;Tive essa ideia há pelo menos seis anos. E que coincidiu com o sonho do Siron Franco de criar um espaço sobre o acidente. Nosso objetivo é não deixar que a tragédia caia em esquecimento;, salienta ele, que teve parte da família destruída pela contaminação.
Também presidente do Conselho Estadual de Saúde, Odesson perdeu os irmãos Ivo e Devair, a sobrinha Leide e a cunhada Maria Gabriela. Ao todo, 40 integrantes de sua família se envolveram no vazamento do césio. Os poucos dois minutos que Odesson segurou o material radioativo deixou marcas profundas em seu corpo. ;Passei dois anos e meio na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) para receber enxerto na mão;, conta.
Ouça entrevistas:
Artista plástico Siron Franco: