Em 2000, pesquisadores da Universidade de Campinas (Unicamp) elaboraram um mapa da exclusão social, "que é praticamente o mesmo que Josué de Castro lançou na década de 50 [do século 20]", na opinião do economista Ricardo Amorim, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Ele lembrou que a região Norte-Nordeste continua sendo a mais pobre e a mais afetada pelas questões de desigualdade e de pobreza no Brasil, "o que é gravíssimo" porque, nesse período, é quando o Brasil dá um salto industrial fantástico. "Mesmo assim, nós não conseguimos melhorar a distribuição da riqueza no Brasil inteiro".
Os reflexos desse quadro podem ser notados nos fluxos migratórios, na favelização, na concentração da pobreza nas grandes cidades.
Para que haja uma redução efetiva do número de pobres no Brasil, o pesquisador do Ipea destacou a necessidade de serem promovidas reformas civilizadoras do capitalismo, "coisa que todos os países capitalistas avançados já fizeram faz tempo".
A primeira medida é a reforma agrária. "É uma reforma necessária ainda a ser feita". Outra prioridade é a reforma tributária. "Não é fazer reforminha de impostos, diminuir um pouquinho a alíquota aqui, aumentar acolá. Ou então, fazer uma redistribuição da renda entre as regiões brasileiras, um pacto federativo. Não se trata disso".
Amorim propôs uma taxação "forte" das pessoas mais ricas do país, com a desoneração das pessoas mais pobres e da classe média brasileira.
Avaliou que essa medida, já promovida pelos países industrializados, deu ao Estado um fôlego de recursos suficiente para criar o bem estar social europeu. Os governos da União Europeia taxam fortemente os mais ricos e redistribuem essa carga sob a forma de benefícios sociais para a população como um todo.
Outra medida fundamental diz respeito à reforma urbana, para evitar que a especulação imobiliária jogue a população mais carente para as periferias das cidades, obrigando o governo a "gastar fortunas" em urbanização de áreas.
Ele enfatizou que as três reformas redistributivas devem ser feitas se a meta é construir um país que tem futuro e que não precise ficar temendo por suas crianças em relação ao tráfico de drogas e à criminalidade. "A pobreza não gera criminalidade, mas a desigualdade sim", observou o economista.
Ricardo Amorim analisou que em relação à pobreza, houve um ganho líquido desde o lançamento do Plano Real, "mas concentrado nos últimos anos". Segundo ele, foi uma piora pequena, considerando que o Brasil já vinha de um quadro de estagnação desde o começo dos anos 80. "Mas, em termos numéricos, o aumento da pobreza e da desigualdade não é tão grande".
A partir de 1999, a retomada da indústria e das exportações acabou estabilizando a situação da sociedade brasileira. Desde 2004, o ganho foi mais significativo. Amorim salientou, contudo, que embora tenhamos melhorado um pouco a distribuição da renda e a pobreza, "nós muito mal arranhamos a péssima distribuição brasileira, que tem 500 anos".
"Essa distribuição de renda brasileira é muito mais profunda e mais grave e, com certeza, vai levar décadas para conseguirmos reverter isso, se tivermos políticas desde já. De qualquer forma, a resistência da elite será muito intensa e é difícil esperar uma mudança importante para os próximos dez a 15 anos".
Disse que, com crescimento econômico, toda a população ganhará. "Ricos e pobres ganharão. Mas a desigualdade não será vencida".