São Paulo - Em pelo menos três anos o país pode começar a usar para transplante o coração de quem morre nas emergências de hospitais ou que tem morte encefálica. A técnica de transplantar coração que já parou de bater é considerada nova e já é adotada em outros países com sucesso.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), Valter Garcia, que participou do simpósio Doação e Órgãos e Transplante no Brasil: Situação Atual e Propostas de Aprimoramento, na Sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), esse processo requer uma série de aprimoramentos do sistema de saúde, além de mudanças na legislação e informação da população.
;Porque uma pessoa que chega na emergência e morre ali, se for colocada em circulação extra corpórea rapidamente, pode ter alguns órgãos que ficam viáveis por algumas horas. Mas hoje no Brasil é proibido mexer no cadáver sem autorização da família. Vamos ter que mudar a lei, mas para isso temos que passar por programas e entrevistas na mídia explicando para a população para que ela peça essa alteração;.
De acordo com Garcia, esse tipo de doador tem aumentado de 20% a 40% o número de transplantes no mundo. No Brasil esse número pode chegar a 20%, pelo menos. ;Nós sempre teremos mais necessidade do que doadores. A não ser que mude o paradigma e passemos a utilizar o doador após a parada do coração, porque o número de morte encefálica é menor do que o número de pessoas que ingressam em fila [de transplante];.
Garcia disse que a situação atual dos transplantes é mais ;confortável; do que era três anos atrás. Ele explicou que a melhora ocorreu de 1997 a 2004 e de 2005 até o primeiro semestre de 2007, a partir de quando houve uma queda. Em seguida houve uma recuperação que já passou os níveis de 2004. ;Mas o caminho é muito árduo porque nós temos que, nos próximos 10 anos pelo menos, duplicar o número de transplantes e de doações no país porque a demanda é muito grande. A fila está aumentando. Nós só vamos equilibrar a fila possivelmente daqui a dez anos;.
Entre os órgãos mais demandados estão os rins, com 34 mil pessoas na fila em todo o país. Acontecem no país cerca de 13 mil mortes encefálicas, das quais 6 mil são notificadas e apenas 1,3 mil se tornam doadores. A cada ano, aproximadamente 13 mil pessoas entram na fila do transplante. "Por isso, só com doador em morte encefálica não vamos terminar com a fila".
"No caso do rim, a fila é grande porque o paciente conta com a diálise, que o mantém vivo enquanto o transplante não ocorre;. No caso dos transplantes de fígado, explicou Garcia, a entrada na fila é praticamente igual à de pacientes de rim, mas quem não consegue o transplante acaba morrendo rapidamente.
Já nos transplante de córneas a entrada de pacientes na fila é maior, mas como é mais fácil obter córneas, a fila não permanece grande. As córneas para doação podem ser retiradas até seis horas depois da parada do coração. ;A fila está quase desaparecendo em todos os estados, principalmente em São Paulo. Possivelmente em dois ou três anos, se continuar melhorando, podemos chegar próximo de zero;.
Para transplantes de coração a lista de espera é pequena, porque há diversos medicamentos que evitam a necessidade do transplante. No entanto, quando o paciente entra na fila, já está muito doente.
Garcia ressaltou que São Paulo é o estado onde mais se fazem transplantes no Brasil em números absolutos, porque tem a maior população. Em números relativos, aparecem Santa Catarina, São Paulo e Rio Grande do Sul. ;Esses três são os que têm o sistema mais organizado. Muita gente vai para esses estados, mas as pessoas do Norte e Nordeste também vão para o Ceará, que tem o sistema muito organizado também;.
Segundo o médico, esse deslocamento é dificultoso e o ideal seria que houvesse condição de realizar transplantes em cada estado ou região. ;Para isso falta organização, educação, equipamentos, hospitais e profissionais capacitados, equipes 24 horas por dia, senão perde-se o doador;.