Para os homens, é um assunto quase proibido. Só de ouvirem a palavra, já torcem o nariz. Por causa da desinformação e do preconceito, o câncer de próstata acomete 50 mil brasileiros por ano, de acordo com estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca). A boa notícia é que, com o diagnóstico precoce, 90% dos casos são curáveis. Por isso, a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) iniciou ontem uma campanha nacional de conscientização sobre a importância da prevenção, na qual busca mostrar que o tratamento é mais simples do que se imagina.
Além de disponibilizar um rico material no site da sociedade (www.sbu.org.br), a estratégia apela para o futebol. Estão previstos anúncios em uma revista dedicada a esse esporte, além de campanhas nos estádios, envolvendo os times mais populares. ;Assim como ocorreu com as mulheres, com as campanhas de prevenção ao câncer de útero, temos de conscientizar os homens. Desde pequenos eles devem saber da necessidade de fazer o exame de toque retal;, diz o coordenador de campanhas públicas da SBU, o urologista Aguinaldo Nardi.
É aí que entra o problema. O exame, pelo qual o médico avalia o tamanho e a textura da próstata do paciente, ainda é um tabu. Poucos homens sabem, por exemplo, que dura entre cinco e sete segundos. ;Existe um preconceito bobo. O exame não fere a masculinidade de ninguém;, defende o presidente da sociedade, o urologista José Carlos de Almeida. Graças a campanhas educativas, nos Estados Unidos as taxas de mortalidade por câncer de próstata vêm diminuindo 4% ao ano. Já no Brasil, onde morrem 20 mil homens anualmente por causa da doença, os índices não aumentam, mas também não sofrem quedas significativas desde a década de 1990. ;Falta engajamento da sociedade, da mídia e do governo. Há décadas não se vê campanha oficial sobre o câncer de próstata;, critica Almeida.
Idade
Embora as causas do câncer de próstata sejam desconhecidas, alguns fatores parecem estar ligados à sua incidência. Quanto mais velho o homem, maior a probabilidade de desenvolver o tumor. O histórico familiar também influencia, e homens negros são mais afetados pela neoplasia. Há alguns anos, os médicos observaram que os hábitos alimentares podem estar relacionados com a doença. Estudos mostraram que o consumo excessivo de gordura animal é um fator de risco. Mesmo que não existam ainda comprovações, os médicos recomendam a ingestão de legumes, frutas e verduras; de alimentos ricos em vitaminas A, D e no antioxidante selênio (encontrado em alguns peixes e na castanha-do-pará, por exemplo), além de chá verde.
Os jovens adultos devem ficar atentos. Enquanto há cerca de duas décadas a doença atingia somente pessoas com mais de 60 anos, hoje já há detecção de câncer na próstata em homens de 40. De acordo com o urologista Carlos Corradi, representante do departamento de uro-oncologia da SBU, ainda não é possível saber se, de fato, a doença está aparecendo em homens mais jovens ou se o aumento da incidência está relacionado ao diagnóstico precoce. Mesmo assim, ele recomenda que o exame seja feito a partir dos 40 anos. ;É importante porque o câncer, na fase inicial, não apresenta sintomas. E a pessoa não pode esperar;, ressalta.
O professor aposentado Francisco (nome fictício a pedido do entrevistado), 62 anos, se arrependeu de não ter ouvido os apelos da mulher para que fizesse exames de rotina. Ele procurou um urologista há um ano porque começou a sofrer de incontinência urinária. Ele só se submeteu ao exame do toque por insistência do médico. O câncer estava avançado e foi necessário uma cirurgia para retirar a próstata. ;Eu poderia ter evitado passar por isso. O preconceito é grande. O exame é invasivo e incomoda um pouco, mas não é melhor do que ter de retirar a próstata?;, questiona.
Cirurgia
A cirurgia de próstata é outro tabu para os homens. Os médicos dizem que o procedimento é seguro, embora possa, de fato, prejudicar a ereção. ;Existem chances de ocorrer disfunção erétil. Porém, é algo facilmente reversível;, avisa o presidente da SBU. ;Quanto mais jovem o paciente, e isso depende do diagnóstico precoce, maiores as chances dos nervos da ereção serem preservados. Em média, 90% das pessoas nessas condições que se submetem à cirurgia mantêm-se potentes;, completa Carlos Corradi.
Hoje, além da cirurgia convencional, outros dois métodos menos invasivos estão disponíveis em algumas clínicas particulares. Na prostatectomia radical laparoscópica, descrita pela primeira vez há 10 anos e recém-chegada ao Brasil, o médico introduz um tubo longo e fino no corpo do paciente, por meio de uma pequena incisão na pele. O instrumento, feito de fibra óptica, permite a visualização do interior do organismo. Já a robótica é um procedimento igual, com a diferença de que o médico controla um robô.
De acordo com um estudo publicado este ano no Journal of Clinical Oncology, dos Estados Unidos, as intervenções consideradas menos invasivas já representam 31% das retiradas completas da próstata naquele país. Em 2005, o percentual era de 12,2%. A mesma pesquisa, porém, indica que mais de 25% dos homens que optaram pela técnica tiveram problemas de ereção, contra 10% dos que se submeteram ao método tradicional.
;Não existe nenhuma vantagem terapêutica de uma técnica sobre a outra. O que existe é um marketing pesado dos fabricantes;, denuncia o presidente da SBU. ;A cirurgia robótica exige um investimento astronômico, não só na compra como na manutenção (dos equipamentos);, diz. O preço da máquina equivale a R$ 4 milhões. ;O importante mesmo é a experiência do cirurgião. Hoje, a cirurgia aberta não leva nem duas horas, dependendo do médico. Já a laparoscópica varia de quatro a cinco horas e a robótica pode passar de cinco;, afirma Carlos Corradi.
O número
7 segundos
é o tempo que dura, aproximadamente, o exame de toque retal, no qual o médico analisa o tamanho da próstata do paciente