Jornal Correio Braziliense

Brasil

Lei dificulta prisões

Maior operação de combate à pedofilia no país termina com apenas três detenções. Legislação atual prejudica a repressão a quem costuma acessar a internet em busca de imagens de abuso infantil

No momento em que o Brasil deflagra sua maior mobilização de combate à pedofilia, sobram críticas à legislação. A Operação Carrossel II, deflagrada ontem pela Polícia Federal em 17 estados e no Distrito Federal, envolveu 650 agentes, que cumpriram 113 mandados de busca e apreensão de computadores com imagens de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. No entanto, até o início da noite, só três pessoas haviam sido presas, porque foram pegas em flagrante. O baixo número de detenções em uma ação com tantos suspeitos (os donos das mais de 100 máquinas apreendidas) se deve à legislação penal em vigor no país. Hoje, só é considerado crime enviar ou produzir material pornográfico envolvendo menores. A lei não prevê, no entanto,punição para quem armazena essas imagens. Por isso, a PF não pôde prender a grande maioria dos investigados. ;Muitos países têm essa deficiência legislativa;, ponderou o delegado Adalton Martins, coordenador da unidade da Polícia Federal que trabalha na repressão a crimes cibernéticos. Delegado Adalton Martins e senador Magno Malta (PP-ES) comentam a operação Carrossel II De acordo com o delegado, a prisão só pode ser efetuada quando é feito o flagrante de envio ou recebimento de material pornográfico. As prisões ocorreram em Viamão (RS), Florianópolis (SC) e Belo Horizonte (MG). Uma quarta pessoa foi detida no Rio Grande do Sul por posse ilegal de arma. Na capital mineira, por exemplo, os agentes flagraram um aposentado de 53 anos no momento em que ele recebia e repassava conteúdo pornográfico envolvendo crianças pela internet. Já na Paraíba, a Polícia Federal apreendeu material com conteúdo pornográfico infantil em uma residência localizada no Bairro Santo Antônio, em Campina Grande, e em outra casa na zona rural de Puxinanã. A operação em território paraibano contou com a participação de 30 policiais federais, que cumpriram os dois mandados de busca e apreensão expedidos pelo juiz Marcelo Rosado, da 6; Vara Criminal Federal de Campina Grande. Identificação Segundo o delegado Martins, o próximo passo é investigar o material apreendido para ver se é possível identificar os criminosos. ;Os agentes vão abrir os discos rígidos (dos computadores) para identificar quem está (nas cenas) e usar a perícia para chegar a essas pessoas;, observou. A ação brasileira foi realizada em conjunto com a Interpol e envolveu outros cinco países ; Israel, Japão, República Tcheca, Portugal e Senegal ; de um total de 70 que participam do combate à pedofilia. No Brasil, o maior número de apreensões ocorreu no estado de São Paulo (ver quadro). Os mandados foram expedidos a partir de investigações sobre pessoas que estavam usando empresas ou locais públicos ; como hotéis e aeroportos ; para acessar o conteúdo ilegal pela internet. A primeira etapa da operação, em dezembro de 2007, ajudou nas ações de ontem. Em Pernambuco, o investigado era um rapaz que se tornou suspeito de alimentar sites de pornografia infantil depois das análises realizadas no material apreendido na primeira fase, quando nenhum município pernambucano foi alvo da ação. A Operação Carrossel I também terminou com três prisões. No entanto, hoje todos estão soltos. Para o senador Magno Malta (PR-ES), presidente da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Pedofilia, é urgente a votação do projeto que tipifica crimes cibernéticos. O texto prevê a detenção de quem adquirir, possuir ou armazenar, por meio de fotografia, vídeo ou outra forma de registro, imagem que contenha cenas de sexo envolvendo criança ou adolescente, com reclusão de quatro anos e multa. Aprovada no Senado, a proposta aguarda votação na Câmara. ;Há de haver sensibilidade dos deputados para votar imediatamente o projeto;, defende Malta (PP-ES). A deputada Maria do Rosário (PT-RS) considera importante ampliar a lei. ;É preciso criar mecanismos que criminalizem o assédio nas redes de bate-bapo;, exemplifica. A lei, porém, é alvo de críticas de alguns especialistas em ineternet. Para alguns, se não for bem estudada, a proposta pode levar a exageros, como a criminalização de quem receber um e-mail contendo imagens de pedofilia e não descartar o conteúdo de sua máquina. Titulo em duas linhas

Uma tecnologia de rastreamento de acessos à internet desenvolvida pela Polícia Federal já ajudou 70 países a identificar a prática de pedofilia. Avisados pela polícia brasileira sobre usuários da rede de computadores que acessavam sites brasileiros com imagens de crianças sofrendo abusos, governos como o da Grécia e de Portugal conseguiram efetuar prisões ; nesses lugares, a posse desse tipo de material no computador configura crime, facilitando a detenção de suspeitos. De acordo com o delegado da PF Adalton Martins, que trabalha na repressão a crimes cibernéticos, as investigações desencadeadas pelas operações Carrossel I e II contribuíram para identificar cerca de 200 pedófilos em todos os países que se mobilizaram. Ranking ;O Brasil está em quarto lugar (no número de criminosos identificados). A Alemanha está sempre como primeira da lista;, ressalta Martins. Também estão à frente do país os Estados Unidos e a Itália. Na Holanda, foram identificados 100 pedófilos. Em Israel e na Grécia, 30 e 22, respectivamente. Ontem, em Portugal, foram executados 18 mandados de busca e apreensão e 23 pessoas foram presas por suspeita de pedofilia. Martins explica que a PF e a Interpol têm mantido contato com as autoridades policiais desses países no sentido de auxiliar na prisão dos criminosos. ;O primeiro contato é feito com as representações e embaixadas desses países no Brasil;, diz. Segundo o delegado, o ideal seria uma operação internacional conjunta, mas cada país tem preferido colocar em prática sua própria estratégia. ;Israel, Japão, República Tcheca, Portugal e Senegal realizaram a operação junto com o Brasil. Alguns países vão iniciar a operação em breve;, ressaltou. Segundo Martins, a diferença de fuso horário é um fator que dificulta a mobilização simultânea. Na Grécia, a polícia prendeu nove pessoas acusadas de troca de material de pedofilia. De acordo com informações divulgadas pela Direção de Segurança em Atenas (capital), as imagens teriam sido capturadas em um site hospedado no Brasil. As investigações chegaram a 349 usuários gregos que acessaram a página brasileira na internet com material que configura abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. Entre os detidos, estão um oficial do Exército, um professor, dois médicos, um engenheiro e um operário.