Jornal Correio Braziliense

Brasil

Para definir as regras

STF começa amanhã a julgar demarcação da reserva indígena localizada em Roraima. Segundo ministros, independentemente do resultado, Corte estabelecerá critérios que vão orientar delimitação de outras áreas

Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) dizem que, seja qual for a decisão sobre a legalidade da reserva Raposa Serra do Sol (RR), o tribunal vai estabelecer critérios para a demarcação de terras indígenas e áreas de fronteira no país. Cercado de polêmica, o julgamento terá início amanhã. O tribunal vai analisar uma ação contra a demarcação contínua da área, criada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e homologada por Luiz Inácio Lula da Silva em 2005. Além dos índios, arrozeiros ocupam a área e se recusam a sair. ;Independentemente do resultado, esse julgamento vai balizar critérios para a demarcação em terras de fronteiras, a participação dos estados nesse processo, a questão federativa. Vai ser rico nesse tipo de orientação;, disse o presidente do STF, Gilmar Mendes. Relator da ação, o ministro Carlos Ayres Britto concordou: ;Vamos decidir sobre Raposa Serra do Sol. Mas se decidirmos a partir de coordenadas constitucionais, objetivas, isso servirá de parâmetro para todo e qualquer processo demarcatório ; se não para os passados, pelo menos para os futuros;, declarou. ;Sem dúvida, se o Supremo fixar que a demarcação deve ser setorizada em ilhas, isso se estenderá por todo o território nacional;, completou o ministro Marco Aurélio Mello, ao comentar uma das hipóteses discutidas. Os integrantes da Corte não quiseram adiantar de que forma vão votar no julgamento. Na segunda (25/08), o relator se reuniu com representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e advogados de lideranças indígenas, que defenderam a constitucionalidade da demarcação contínua, e com o deputado Francisco Rodrigues (DEM-RR), representante dos arrozeiros. O parlamentar alega que é preciso reduzir o tamanho da reserva. ;Assim, estariam acomodados interesses de pouco mais de 15 mil indígenas aculturados, sem criar problemas para o desenvolvimento do estado;, afirmou. O STF reservou todo o dia de amanhã e também a sessão de quinta-feira para discutir o tema. ;Quando fiz o voto na ação sobre células-tronco embrionárias, eu disse para mim mesmo: ;Pronto, nunca mais vou receber um processo tão complexo como esse;. Pois recebi;, brincou o ministro. Manifestações Lideranças indígenas em todo o país articulam manifestações que serão realizadas hoje e amanhã. Em Brasília, a advogada wapichana Joênia Batista de Carvalho, de Roraima, representante das comunidades da reserva, preparou um memorial para entregar a Ayres Britto. Segundo ela, a expectativa dos povos indígenas é de que o Supremo julgue a ação com base em uma análise técnica e jurídica. ;Se for assim, não há por que nos preocuparmos, uma vez que não temos dúvidas sobre a constitucionalidade do decreto da demarcação contínua;, afirmou. O Movimento Nacional dos Direitos Humanos (MNDH) emitiu nota em que aponta como ;falaciosos; os argumentos de risco às fronteiras nacionais e à soberania. ;Não se faz o mesmo alarde quando empresas estrangeiras e transnacionais adquirem grandes extensões de terra nas faixas de fronteira;, diz o texto. Hoje, grupos indígenas participarão de uma sessão solene no Teatro Nacional de Brasília. À tarde, os manifestantes seguirão para a Praça dos Três Poderes, onde realizarão o último ato público antes do julgamento a favor da demarcação contínua das terras. O relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais dos Povos Indígenas, James Anaya, disse ontem que há necessidade de negociação entre fazendeiros, indígenas e governos na região. ;Os interessados são a favor de um desenvolvimento, mas parece haver diferença nos modelos de desenvolvimento defendidos;, observou.

Colaborou Hércules Barros Ouça podcasts: com Carlos Ayres Britto e James Anaya