Após apenas quatro meses de trabalho, 27 juízes empossados no início de abril no Tocantins já podem pendurar a toga e sair de férias. A regalia começou a valer na sexta-feira, por decisão do presidente do Tribunal de Justiça do estado, desembargador Daniel Negry. O privilégio foi concedido com base num parecer emitido, sem alarde, em 2006 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que pode ser aplicado por todos dos tribunais.
Com o ato do TJ de Tocantins, os juízes substitutos nomeados em 2008 foram liberados de cumprir um ano de serviço antes de sair de férias, regra que vale para todos os trabalhadores brasileiros. O privilégio, que foi defendido pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), revoltou advogados do estado e deve deixar sem comando diversas comarcas do interior.
O anúncio das férias antecipadas em Tocantins já causa frustração em cidades que receberam este ano seu primeiro juiz, diz o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Tocantins, Ercílio Bezerra. Ele afirma que a decisão do tribunal é uma afronta aos cidadãos que buscam seus direitos na Justiça do estado: "O principal requisito para se tirar férias é cumprir o período mínimo de um ano de serviço. Não consigo explicar para a classe trabalhadora como alguém pode começar o trabalho pelas férias".
Há dois anos, em resposta a consulta feita pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, o CNJ estabeleceu que as férias dos juízes não podem ser comparadas às dos demais trabalhadores. "As férias para a magistratura estão sujeitas a um regime especial e, por isso, não se pode exigir qualquer período aquisitivo para fins de fruição", escreveu a conselheira Germana Moraes. Para o presidente da OAB tocantinense, o parecer não justifica a concessão do privilégio: "A decisão pode ter roupagem legal, mas é imoral."
O presidente do TJ de Tocantins informou que só comentaria as críticas na segunda-feira. Já a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) saiu em defesa dos juízes tocantinenses. "Quem decide a escala de férias hora de tirar férias são os tribunais, não os magistrados. Nem sei se esses juízes, que acabaram de tomar posse e devem estar empolgados para trabalhar, queriam tirar férias tão cedo", disse o presidente em exercício da AMB, Claudio dell'Orto.
Para o presidente nacional da OAB, Cezar Britto, a concessão da regalia compromete a imagem do Judiciário: "A magistratura tem decidido que o que vale para o cidadão comum vale também para os servidores públicos, mas não aplica essa regra a seus próprios integrantes. Isso passa uma imagem de incoerência e vai agravar a morosidade da Justiça."
O tribunal do Distrito Federal confirmou que a norma do CNJ já beneficia seus magistrados, mas não soube informar quantos dos 23 juízes substitutos nomeados desde a consulta saíram de férias antes de completar um ano de serviço. No Tocantins, o privilégi foi regulamentado por uma instrução normativa editada em maio. Para facilitar a concessão das férias, o presidente do TJ do estado distribuiu um formulário a ser preenchido pelos juízes. "O presidente do Tribunal de Justiça determinará os períodos de gozo das férias dos juízes que não apresentarem seus pedidos", escreveu Nery.