Jornal Correio Braziliense

Brasil

Apreensões de drogas crescem no país

Interceptações de pasta base de cocaína, usada na fabricação de crack e merla, aumentaram 80% no país. Novas rotas detectadas e maior consumo pela classe média preocupam autoridades

As apreensões de pasta base de cocaína no país aumentaram em 80% nos últimos seis meses em relação ao mesmo período do ano passado. O crescimento coincide com a maior produção na Bolívia e no Peru. Somente este ano, a Polícia Federal conseguiu tirar de circulação 8,5 toneladas do entorpecente, sendo 1,7 tonelada no mês passado. As estatísticas assustam as autoridades brasileiras, já que a droga é a matéria-prima para a fabricação do crack e da merla. Além disso, a PF tem constatado o aparecimento de novas rotas, inclusive uma em que o traficante anda até 80km para alcançar a fronteira do Brasil. O dado mais preocupante é que o uso dos dois tipos de droga não se restringe mais a pessoas de baixo poder aquisitivo, mas também à classe média das grandes capitais.

Com a repressão às Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farcs), que dominavam os plantios de coca principalmente em Barrancominas, região andina colombiana, o narcotráfico migrou para a Bolívia e o Peru, onde a produção cresceu muito nos últimos anos. Com isso, e pela proximidade com o Brasil, o tráfico se acentuou na fronteira e ganhou as grandes cidades. O Rio de Janeiro, onde o crack tinha consumo baixo, passou a ser um mercado próspero. Um exemplo disso foi visto ontem, quando a PF descobriu um laboratório caseiro de refino de cocaína em São Paulo. O negócio estava sendo tocado de forma integrada por membros do Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV). Na casa estava sendo refinada cocaína, crack e merla.

Junto com o crescimento do tráfico de pasta base, ficou constatado que o PCC mantém emissários em Santa Cruz de La Sierra encarregados de mandar a droga para o Brasil. Até então, a facção criminosa comercializava maconha nos presídios, seu principal mercado. O negócio lucrativo e destruidor proporcionou a união com o CV, que atua principalmente nos morros do Rio. O primeiro grupo entrou com sua clientela, praticamente formada de detentos, ao passo que os traficantes fluminenses disponibilizaram sua logística para facilitar a entrada da pasta base no país.

Laboratórios
Com as restrições ao uso de produtos químicos como acetona e éter, a produção de pasta base passou a ser feita em laboratórios rústicos na floresta boliviana e peruana. A cal, usada no refino, está sendo substituída por cimento. À fórmula são acrescidas ainda barrilha para limpar piscina, soda cáustica, ácido sulfúrico, gasolina e solução de bateria de carro. ;O crack é uma droga devastadora;, acrescenta o delegado que chefia o setor de Repressão à Entorpecentes da PF, Paulo Tarso de Oliveira Gomes. Ele confirma o aumento das apreensões no Brasil. Para tentar estancar o refino nos países vizinhos, a Polícia Federal está controlando a exportação de alguns produtos, como o cimento e até mesmo o papel higiênico, usado como filtro nos laboratórios.

Isso tornou a droga mais barata e ao alcance de viciados de baixa renda. Porém, chegou também à classe média, onde estão sendo registrados diversos casos. Hoje, 1kg de pasta base custa 25% do preço da mesma quantia de cocaína pura. ;A margem de lucro é menor, mas a comercialização é maior e o custo com a produção é pequeno;, explica um delegado da PF. Segundo o policial, a coca plantada na Bolívia também tem um teor toxicológico maior que a da Colômbia e Peru. Toda a droga em estado de pureza chega ao país, mas grande parte segue para a Europa e os Estados Unidos. E o volume não é pequeno. Em março, em uma só operação, a PF apreendeu uma tonelada da droga, que iria para a Polônia e Holanda. ;É só o Brasil que consome a pasta;, observa o delegado Mauro Spósito, coordenador-geral de Operações Especiais de Fronteira da Polícia Federal.

As autoridades brasileiras sabem que se a droga chegar às cidades, o controle será praticamente impossível. ;O narcotráfico contrata mulas (pessoas encarregadas pelo transporte da droga) para carregar a cocaína nas costas no meio da floresta por até 80km. Hoje os tipos de rotas são bem variados;, diz um delegado da PF. Por isso as autoridades estão reforçando os postos de fronteira, principalmente com a Bolívia e Peru. Na Amazônia, a PF aumentou em 25% seu efetivo e deverá criar novas operações permanentes no Centro-Oeste e Sul do país. Além disso, voltará a fazer ações conjuntas com os países do Mercosul, como vem fazendo há algum tempo com o Paraguai.