Um levantamento realizado durante 16 meses, entre janeiro de 2007 e abril deste ano, em Mato Grosso do Sul pela organização não-governamental Centro de Trabalho Indigenista(CTI) revelou que cerca de 100 índios de várias etnias foram condenados pela Justiça do estado e estão presos sem ter podido aproveitar adequadamente o direito de defesa. Segundo a CTI, outros 200 indígenas estão detidos em delegacias e penitenciárias sem acusação formal do Judiciário. Os dados constam do diagnóstico Situação dos Detentos Indígenas no Mato Grosso do Sul, que será divulgado nesta quinta (26/06) durante audiência pública da comissão de Direitos Humanos do Senado. O problema atinge principalmente os índios das tribos Kaiowá e Guarani.
O levantamento do CTI mostra que os problemas de desrespeito aos direitos humanos começam ainda na fase de inquérito policial. Segundo o estudo, os indígenas que servem de informantes, testemunhas ou indiciados, na grande maioria, não dominam a língua portuguesa, o que dificulta a compreensão das acusações e do processo de defesa. Nas entrevistas e análises dos processos analisados pelo CTI, a grande maioria dos indígenas indiciados, denunciados e condenados desconhecia completamente a situação processual e as regras do sistema prisional.
Os detentos estão concentrados em Dourados (com 68 pessoas), Amambai (23) e Aquidauana (10). Nesses municípios concentram-se os casos de suicídios de índios guaranis nos últimos anos. ;Um aspecto relevante é a constatação da pouca garantia dos direitos nos julgamentos das ações criminais. Detectaram ainda o descumprimento das garantias individuais na fase de execução penal, solapando direitos individuais assegurados na legislação em geral e na indigenista em particular;, diz o documento. Em Mato Grosso do Sul, existem cerca de 50 mil índios. As condenações mais freqüentes foram por homicídio, trafico de drogas, tentativa de homicídio e lesão corporal.
Quase metade dos presos cumprem pena em regime fechado, 15% dos presos aguardam julgamento e outros 12% estão em regime semi-aberto, podendo sair durante o dia e retornar à cadeia à noite. Elaborado em convênio com a Universidade Católica Dom Bosco e financiado por instituições oficiais da União Européia, o diagnóstico mostra, segundo seus coordenadores, que os conflitos pela terra são a principal causa dos desentendimentos entre índios e entre eles e brancos em uma região onde as aldeias estão muito próximas às cidades. O alcoolismo é outra causa das condenações apontada pelo estudo. Mas os coordenadores preferem apontar o alcoolismo como uma conseqüência da falta de terras para que os índios possam plantar e sobreviver.
O presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, desembargador João Carlos Brandes Garcia, estranhou os dados. Segundo ele, é possível que existam quase 100 índios presos. Mas duvidou de que as condenações tenham acontecido sem a adequada defesa dos índios. ;Duvido desse levantamento, até porque a defensoria pública funciona muito bem e tem acompanhado os problemas dos índios no estado;, ponderou o desembargador. A defesa é feita pelos advogados públicos e procuradores da Fundação Nacional do Índio (Funai) ; que não se pronunciou sobre o estudo.
"Detectaram ainda o descumprimento das garantias individuais na fase de execução penal, solapando direitos individuais assegurados na legislação em geral e na indigenista em particular"
Trecho do documento do Centro de Trabalho Indigenista