A Polícia do Exército (PE) deteve na madrugada desta quarta-feira (04/06) o sargento Laci Marinho de Araújo, de 36 anos, que declarou à revista Época que - ao lado de outro sargento, Fernando Alcântara de Figueiredo, de 34 anos - formava o primeiro casal assumido de homossexuais na ativa no Exército brasileiro. A PE alegou crime de deserção, já que Laci não comparecia à unidade onde serve há oito dias. O sargento diz que sofre de esclerose múltipla e alega ser vítima de perseguição.
Após estamparem a capa da revista Época esta semana, os dois deram na noite desta terça-feira (03/06) uma entrevista ao programa da Rede TV apresentado por Luciana Gimenez. A Polícia do Exército, minutos antes do fim do programa, por volta das 23h30m, cercou os estúdios da emissora, localizada em Alphaville, na Grande SP.
Relacionamento de 11 anos
O casal de homossexuais mantém um relacionamento desde 1997. Durante a entrevista, os sargentos, que vivem em um apartamento do Exército na Asa Norte de Brasília, afirmaram à apresentadora que tinham medo de morrer se fossem presos pela Polícia do Exército. Após o programa, os dois se recusaram a sair da emissora. Ambos se conheceram no Batalhão da Guarda Presidencial. À revista Época, Laci disse: "Para um gay, as Forças Armadas são um paraíso."
Dentro da emissora, Laci Marinho de Araújo solicitou a presença de entidades de direitos humanos. Ele se rendeu por volta das 4h, após oficiais do Exército aparecerem com um mandado de prisão. O sargento foi levado para o Hospital Geral do Exército, no Cambuci, zona sul da capital. O sargento Fernando, parceiro de Laci, não acredita que o companheiro permaneça detido.
;Eu acho muito difícil ele ser preso. Eles podem até tentar, mas não vão conseguir,; disse.
Na entrevista à revista Época, o casal conta que se conheceu dentro do Exército, em 1995. Fernando, então com 22 anos, chegou à Brasília após ter feito 11 meses de curso preparatório para sargento em Juiz de Fora (MG). Laci havia feito o curso em Três Corações, interior de Minas. Em 1997, os dois decidiram sair do alojamento do Exército e morar juntos numa república. Hoje, vivem num apartamento funcional das Forças Armadas, em Brasília.
Companheiros de emprego
A intimidade dos dois chamava atenção de colegas e superiores, mas os dois garantiam que eram apenas amigos até falarem à revista. "Somos um casal e mantemos uma relação estável há mais de 10 anos," disse Laci, acrescentando que até no cartão de crédito o outro é colocado como dependente.
Segundo a revista, Laci é falante, deu entrevista com os dedos cheios de anéis. Faz sobrancelha, usa cremes anti-envelhecimento e depila a barba com cera. "Existe coisa melhor para um homossexual do que tomar banho com um monte de homem pelado e sarado?" disse ele à Época.
Laci Marinho de Araújo acusa a Polícia do Exército de 'forçar' a situação dele para a prisão. "Eles forçaram a situação e forjaram um laudo para me colocar como apto ao serviço, sendo que eu não estou apto, pois estou passando por um transtorno emocional grave," afirmou Araújo.
Afastado por motivos de saúde
Em nota, o Exército diz que Laci se afastou por seis meses do serviço 'alegando motivos de saúde' em 2007. Ele 'deixou de apresentar laudos referentes aos exames determinantes comprobatórios de seu estado de saúde, bem como recusou-se a receber médico militar especialista (neurologista) que deslocara-se até a sua residência para atestar sua condição e compor os autos da investigação'. Pelo fato de não ter apresentado os laudos, o Exército diz que o sargento teve 'postura inadequada, incoerente, indisciplinada e duvidosa'.
O sargento se defende e diz que apresentou o laudo de um neurologista atestando o transtorno emocional, mas o parecer não foi aceito. Araújo disse ainda ter sido examinado, por conta do problema emocional, por uma junta médica que incluía um ginecologista e um ortopedista.
"É uma situação degradante. Eu temo pela minha vida. Não tenho condições físicas e emocionais de ser encarcerado," afirmou.
Araújo criticou ainda a atuação da procuradora do Ministério Público Militar Cláudia Rocha Lama. Ele disse que o Exército é uma 'quadrilha devidamente concursada' e uma 'instituição cheia de covardes'.
O sargento disse ainda que seu companheiro enviou uma petição com mais de 15 páginas explicando a situação dos dois ao general Enzo Martins Peri, comandante do Exército. O documento, segundo ele, foi rejeitado três vezes por 'erro de formatação'.