Uma estrela apagada que quase havia desistido da música, um viciado em heroína criador de problemas e um ser andrógino taxado de estranho. O cenário com essas três figuras peculiares poderia ser um bar decadente ou um centro de reabilitação. Mas foi na composição artística e nos palcos que Lou Reed, Iggy Pop e David Bowie se encontraram, em meados dos anos 1970. E mudaram a cara do rock.
Dangerous glitter: como David Bowie, Lou Reed e Iggy Pop foram ao inferno e salvaram o rock ;n; roll, escrito pelo jornalista inglês Dave Thompson ; autor de mais de 100 livros sobre a cultura pop ;, tem início nos primórdios de um dos períodos de transição do rock, na Factory, ateliê de Andy Warhol. O ;palco; é o local onde Lou Reed conheceu Nico, engatou um rápido romance com a cantora e, sob o apadrinhamento do astro da pop art, criou aquela que talvez seja a banda norte-americana mais influente da história do gênero: a Velvet Underground.
O autor, fã confesso de Reed, Bowie e Pop, percorre por toda uma época que presenciou e sobre a qual tanto escreveu. Em 400 páginas, a obra viaja dos Estados Unidos à Europa, retratando a situação da indústria fonográfica do período. Os altos e baixos do trio que dá nome ao livro são retratados e, entre eles, estão os trabalhos em conjunto, a ascensão à fama, o consumo desenfreado de drogas ; especialmente por parte de Iggy Pop, que quase sofreu uma overdose ;, as relações comerciais com as gravadoras e outros fatos marcantes.
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Entrevista com o autor Dave Thompson
Por que o Velvet Underground e os Stooges tiveram maior reconhecimento após as bandas acabarem?
Muito disso foi por causa de Bowie. Ele falava sobre eles em toda oportunidade que tinha. Quando ele aparecia na rádio, pedia para o DJ tocar músicas das bandas. Quando ele achou jornalistas que também eram fãs, ficou amigo deles e ficavam falando de Velvet e de Iggy. Daí, mais pessoas ouviam sobre os artistas e começavam a escutá-los.
O senhor disse ter entrevistado Lou e Iggy várias vezes. E Bowie?
Nunca. Ouvi, enquanto escrevia o livro Moonage daydream, que minha amizade com o empresário Tony Defries (do começo da carreira de Bowie), pode ter algo a ver, mas duvido.
O começo do livro se passa na Factory, de Andy Warhol. Em sua opinião, qual a importância dele na cena do rock nos anos 1970?
Os conceitos de arte de Warhol que foram aplicados ao começo do Velvet Underground e dpeois na cena de Nova York em geral foram essenciais para o que veio a ser o glam rock no início dos anos 1970. Os filmes dele eram, em um nível mais superficial, o único lugar em que se poderia ver travestis ;reais;. E, mais importante, os questionamentos dele ao cotidiano foram uma ferramenta muito importante para outras pessoas formularem suas subversões.
O disco Transformer fez de Lou Reed um astro. O álbum Raw power, de Iggy Pop, foi um prelúdio do punk rock. O personagem Ziggy Stardust, de Bowie, mudou o conceito de pop star. O senhor diz escutar músicas deles toda semana. São esses seus trabalhos favoritos deles?
Estão entre meus favoritos, mas os três têm uma variedade tão grande de trabalho que eu só consigo escolher obras prediletas quando quero irritar meus amigos no Facebook (risos). Semana passada, ouvi um box de gravações ao vivo de 1970 do Iggy chamado You want my action. O último de Lou que escutei foi New York, que está definitivamente entre meus álbuns favoritos. E de Bowie, When I;m 5, porque achei apropriado para tocar no 67; aniversário dele.
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O trio teve impacto no glam rock, punk rock, eletropop, new wave e grunge. Mudaram o conceito de pop star. O que temos de Lou Reed, David Bowie, and Iggy Pop em outros artistas hoje? Que outros grandes artistas dos anos 1970 até hoje podemos listar aqui?
É uma resposta boba, mas o que os tornava tão especiais é que eram tão únicos que mesmo os melhores imitadores deles apenas conseguiam captar uma faceta ou das de cada. Não consigo pensar de alguém que teve, ou poderia ter, o mesmo impacto deles e, ao mesmo tempo, conseguir se renovar. O Lou Reed do Velvet Underground não é o mesmo do Transformer, que não é o do Berlin, Metal Machine, Street Hassle; Pode-se dizer o mesmo para Iggy e Bowie.
Dito isso, citaria a (banda) Bauhaus, como artistas que teriam a habilidade para virar uma força maior como eles, mas se perderam. Os dois primeiro álbuns e alguns elementos do terceiro são os melhores momentos dos anos 1990 para mim. As únicas outras pessoas que podem ser mencionadas junto aos três, em termos de nunca (ou raramente) se perder do que os faz especiais são os Sparks (banda americana).
É dito no livro que uma conversa com a Nico há 25 anos deu a estrutura para o livro. Qual foi sua maior motivação para escrevê-lo, tanto tempo depois?
Eu já tinha escrito três livros sobre Bowie, e existem centenas de outros. Existem livros sobre Lou Reed e sobre Iggy Pop. E todos eles falam da relação entre os três, mas sempre superficialmente, em poucos parágrafos, no máximo um capítulo. Eu queria mostrar como Bowie, em particular, era fascinado pelos outros dois e como, enquanto ele criava uma persona de pop star para ele (Ziggy Stardust), ele também estava criando para Lou e Iggy.
Qual foi sua reação quando Lou Reed morreu? Como acha que ele será lembrado, agora que está na "eternidade"?
A morte é sempre triste, principalmente quando é a de alguém que esteve no meu imaginário durante 40 anos. Mas os heróis da minha geração estão ficando velhos e doentes, todos morrerão cedo ou tarde. Quanto ao fato de como ele será lembrado, creio que como era antes de morrer. Já tinha deixado uma marca inquestionável na cultura e já tinha um legado muito tempo antes de partir.
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E quanto a Bowie e Iggy Pop?
O mesmo. Não acho que o disco do ano passado de Bowie tenha sido melhor (nem tão bom quanto) o trabalho dele nos anos 1970. O Iggy tampouco fez algo realmente vital. Mas não importa. Já tinham deixado a marca deles por mais tempo do que a maioria das pessoas conseguirá algum dia na vida.
Quais as principais diferenças do cenário musical daquela época e o de hoje?
O fato de aquela época ter tido um cenário musical (risos). Hoje, é um monte de bandas que fazem um álbum a cada três ou quatro anos, e qualquer união entre elas é acidental ou uma ação risível de marketing. O pop britânico dos anos 1990 foi o último cenário de verdade que vi.
Uma última pergunta: tem algum artista brasileiro que você goste?
Uma das minhas bandas favoritas do momento, Beautify Junkyards (de Portugal), fez um excelente cover de Os Mutantes no ano passado - isso me lembrou o quanto eu adorava eles quando era mais novo.
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